domingo, 22 de janeiro de 2012

As nossas coisas atípicas

 



O caso é tão hilário quanto impactante. Uma professora se inscreve no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), entrega a prova em branco e, pasmem, chegou a receber até 4 pontos a mais que a nota mínima. A intenção não era desmoralizar o sistema, apenas levar o caderno de provas para o cursinho.

A surpresa da semana não para por aí. As contas do Judiciário apontam para uma movimentação “atípica” de R$ 885,7 milhões entre 2000 e 2010. A forma “atípica” apurada pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) sinaliza coisas como falta de controle e desvio de padrão.

E mais: o governo federal gastou em compras sem licitação R$ 13,7 bilhões, quase 48% do total gasto em 2011.

Por mais convincentes que sejam as respostas para explicar tais fatos, espraia-se o sentimento de que a infindável coleção de casos mirabolantes, inusitados, rocambolescos, que emolduram a vida de nossas instituições, é parte de um país profundamente enraizado na cultura da improvisação e do descontrole.

É inescapável a imagem de que ao esforço para se construir uma Nação digna, séria, formal, contrapõe-se um sistema de pressão para deixá-la flutuando nas ondas da informalidade, dando-se vazão ao conceito de que, aqui, tudo é permitido mesmo o que é proibido.

Os três casos arrolados acima se localizam no obscuro limite entre o Brasil formal e o Brasil informal. A queda de braço entre os dois é um exercício de paciência, que se desenrola desde o ciclo colonial, quando não havia separação entre a coisa pública e o negócio privado.

Da administração patrimonialista do sistema monárquico ao modelo da administração por resultados, que o país tenta implantar desde o final da década de 90, as conquistas e avanços obedecem a fluxos e contrafluxos, tendo como calibragem fatores como o tamanho da máquina estatal, as atribuições e funções das estruturas, a argamassa burocrática, o processo de tomada de decisões, os controles e a transparência.

Infelizmente, não tem havido continuum na vida administrativa pública, fato que decorre de imposições de grupos de mando e ajustes ocasionais, sob o patrocínio da velha política.

Traduzindo: os mandatários esbarram, em seus governos, com as pressões de partidos que lhes dão sustentação no Parlamento. A partir dessa barreira, desenha-se a paisagem de obstáculos para a adoção de critérios racionais na administração pública. Basta olhar para as características do momento. É forçoso reconhecer que o atual ciclo se apresenta como um dos mais propícios para mudar a fisionomia carcomida do Estado brasileiro. Vejamos.

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