terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Novo diretor ignora parecer da PGE

Marco Carvalho e Ricardo Araújo - repórteres

O Ministério Público apontou indícios de envolvimento do atual diretor-geral do Detran/RN, Érico Vallério Ferreira de Souza, no suposto esquema de fraudes na autarquia. É a primeira vez que as investigações da Operação Sinal Fechado atingem um indicado pela gestão da governadora Rosalba Ciarlini. De acordo com a apuração dos promotores de Justiça da Defesa do Patrimônio Público, Érico contribuiu com os interesses particulares do grupo chefiado por George Anderson Olímpio da Silveira.

Ontem, a Justiça permitiu a divulgação da íntegra da denúncia do Ministério Público contra 34 pessoas suspeitas de fraudes no Detran/RN. O documento permitiu o alcance de esclarecimentos sobre a investigação conduzida pelo MP. Para os promotores, o atual diretor do Detran desconsiderou pareceres da Procuradoria-geral do Estado e deu prosseguimento a uma licitação que aparentava possuir graves irregularidades.

Segundo aponta a investigação, Érico Vallério ainda pretende se beneficiar de contratos emergenciais que podem se concretizar neste final de ano. A acusação gira em torno da taxa cobrada para registro de contrato de financiamentos de veículos, cujos pagamentos são efetuados junto a Central de Registro de Contratos (CRC), através da empresa Planet Business.

Sob responsabilidade do Detran, o serviço de cobrança de tal taxa foi terceirizado na gestão passada da autarquia. O valor é considerado abusivo e a cobrança ilegal. Apesar disso, o Ministério Público aponta evidências que indicavam que a empresa Planet Business ganharia a licitação e permaneceria com a cobrança - gerando "vultosos lucros para a organização criminosa".

A Procuradoria-geral do Estado recomendou que nova pesquisa mercadológica fosse realizada antes que fosse aberta a concorrência. Assim, como fosse apresentado o percentual da receita decorrente da arrecadação. A recomendação é assinada pela procuradora do Estado, Íris de Carvalho Medeiros.

Na contramão das recomendações, Érico Vallério deu prosseguimento à concorrência - que só foi impedida em decorrência da deflagração da operação Sinal Fechado.

Para o Ministério Público, as suspeitas sobre Érico Vallério vão além do desprezo à PGE. De acordo com os promotores, o atual diretor-geral do Detran previu as dificuldades pelas quais iria passar a licitação e já planejava nova contratação emergencial da Planet Business. A denúncia do MP fala que Vallério estava "prestes a praticar outro crime, o de dispensa indevida de licitação".

Os promotores interpretaram os indícios como "intuito de dar continuidade à contratação viciada, para atender aos interesses do grupo chefiado por George Anderson Olímpio da Silveira". A empresa Planet Business tem ligação direta com Olímpio, com que teria celebrado um contrato de gaveta. Sem possuir nenhum estrutura para realizar o serviço de cobrança no RN, a atividade ficava sob responsabilidade das empresas do homem apontado como líder da organização.

O MP revelou que em menos de um ano de atuação, o negócio de registro de veículos lucrou mais de R$ 9 milhões através da cobrança sobre mais de 80 mil veículos do Estado. Durante o dia de ontem, a equipe de reportagem da TRIBUNA DO NORTE tentou entrar em contato com Érico Vallério, mas não o encontrou em seu gabinete no Detran. Assim como não houve resposta aos telefonemas feitos para o telefone funcional e o celular pessoal.

Permanência

A governadora Rosalba Ciarlini declarou ontem durante o Seminário Motores do Desenvolvimento, que o futuro do diretor do Departamento de Trânsito do Rio Grande do Norte (Detran), Érico Valério Ferreira de Souza, no Governo, será discutido junto a assessoria jurídica do Estado. O procurador-geral do Estado, Miguel Josino Neto, irá analisar o processo e pediu cautela no caso. "Não podemos ser precipitados na análise. Vou tirar cópia do processo e lê-lo para poder opinar", disse.

Promotores arrolam 30 testemunhas

O Ministério Público encaminhou à Justiça a lista com 30 testemunhas para deporem no caso das investigações no Detran. Os nomes englobam o marido da governadora Rosalba Ciarlini, Carlos Augusto Rosado, e o vice-governador, Robinson Mesquita de Faria. Além deles, também foram arrolados a ex-consultora-geral do Estado, Tatiana Mendes Cunha, o ex-secretário do governo Wilma de Faria, Vagner Araújo, e o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Paulo Eduardo Pinheiro Teixeira. Carlos Augusto Rosado deve esclarecer a situação é que foi supostamente extorquido. A denúncia dos promotores de Justiça fala que os envolvidos na organização criminosa responsável pelas fraudes no Detran plantariam denúncias contra o governo Rosalba, caso não fosse iniciado um contato no sentido de garantir o consórcio Inspar na inspeção veicular ambiental do Estado. Já a ex-consultora Tatiana Mendes deve prestar informações sobre as recomendações que fez a respeito do projeto de lei que instituía a inspeção veicular no Rio Grande do Norte.

Memória

A Sinal Fechado foi resultado de nove meses de investigação do MP, que teve início após indícios de irregularidades na licitação da inspeção veicular ambiental no RN. A partir daí, os promotores de Justiça descobriram uma suposta organização criminosa envolvida com outras fraudes relacionadas ao Detran. O Ministério Público aponta o advogado e empresário George Anderson Olímpio da Silveira, como chefe da suposta quadrilha. Ele alcançou lucros classificados como ilegais através das taxas de registro de contrato de financiamento de veículos. Após isso, o dinheiro lucrado ilegalmente serviria para abastecer propinas a políticos e lobistas para atuar em favor dos objetivos do grupo.

Presidente da Comissão não quis falar

A presidenta da Comissão Permanente de Licitação do Detran/RN, Maria Selma Maia Pinheiro Medeiros, preferiu não comentar sua possível ligação com os processos licitatórios fraudulentos desencadeados na autarquia entre 2009 e 2010. Ela informou à assessoria de imprensa do órgão que havia recebido ordens do diretor-geral, Érico Vallério Ferreira de Souza, para não conceder entrevistas ou comentar o caso. Além das acusações da Operação Sinal Fechado, Maria Selma já responde por improbidade administrativa ao inquérito civil nº 032 aberto em 2007. O Ministério Público defende que ela e mais três pessoas deve ressarcir o erário público em R$ 60 mil.

No referido inquérito, Maria Selma é denunciada por ter supostamente viciado um processo licitatório para a contratação de uma seguradora de veículos que cobrou preços acima do valor de mercado ao Detran/RN. Além dela, respondem o ex-subsecretário de administração do Detran, Tomaz Salustino Araújo Soares; Ricardo Jorge Azevedo Lima, corretor responsável pela Cabugi Administradora e Corretora de Seguros e Sérgio Correia Ramos, funcionário do Unibanco Seguros.

Dos quatro, somente Ricardo Jorge teceu comentários sobre a acusação. De acordo com o inquérito, a seguradora venceu o processo licitatório cobrando R$ 74.760,06 mensalmente pelo seguro de nove veículos oficiais do órgão. "A proposta foi feita pelo funcionário do Unibanco. Minha única participação foi em avisar à seguradora da licitação que estava aberta e pedir a reserva de mercado em nome da Cabugi Corretora", defendeu-se Ricardo Jorge. Segundo o inquérito, ele teria recebido 35% de comissão pelo serviço. O MP aponta Maria Selma como responsável "por acobertar todas as ilegalidades praticadas pelo grupo". Os demais envolvidos na fraude não foram localizados para comentar o teor da denúncia.

Ex-governadora teria recebido doação irregular

De suposta envolvida à oficialmente denunciada. A ex-governadora Wilma Maria de Faria, mudou o teor do discurso em relação à Operação Sinal Fechado quando soube que figura como acusada na peça entregue pelo MP à Justiça. As provas colhidas pelos promotores apontam que a ex-governadora está diretamente ligada às fraudes desencadeadas no Detran/RN, incluindo suposto recebimento de propina através de doações para a sua campanha eleitoral do ano passado. Do desafio imposto aos promotores no dia em que a ação foi deflagrada, ela amenizou e disse, no sábado passado via Twitter, que nada tem a temer. "A justiça vai prevalecer e a luta continua", ressaltou Wilma no único comentário sobre os novos acontecimentos.

Na denúncia oferecida à juíza Emanuella Cristina Pereira Fernandes, os promotores afirmaram que Wilma de Faria obteve vantagem indevida com o recebimento de R$ 140 mil como doação na campanha eleitoral ao senado, em 2010. Entretanto, numa consulta ao extrato de doadores e fornecedores de campanha de candidatos no portal do TSE, aparece que a então candidata recebeu o valor de R$ 70 mil no dia 21 de setembro do ano passado.

O valor foi oficialmente doado pela Delphi Engenharia Ltda, empresa da qual um dos acusados da Operação Sinal Fechado, Eduardo de Oliveira Patrício, é sócio. Além deste valor, a Delphi doou mais R$ 80 mil em datas diferentes à então candidata ao Senado Federal, Wilma Maria de Faria. De acordo com documento do MP, a intermediação entre a suposta doação e o doador, George Olímpio, foi feita pelo diretor da Delphi, Eduardo Patrício. No cumprimento dos mandados de busca e apreensão nos escritórios e residências do acusados, os promotores encontraram um contrato de mútuo entre George Olímpio e empresa de engenharia. O acordo teve o vencimento de uma parcela de R$ 70 mil no mesmo dia - 21/09/2010 - que a Delphi efetuou a transferência bancária para a conta de campanha da então candidata Wilma. Na peça confeccionada pelo MP, afirma-se que "Este simulacro de contrato foi assinado por Cíntia Delfino, sua ex-esposa e sócia, que, assim, dissimulou a movimentação financeira dos recursos que seriam dados à ex-governadora Wilma de Faria por George Olímpio, intermediando a transação por meio da mencionada empresa e conferindo aparência de legalidade a doações de campanha que constituíram, em verdade, o pagamento da vantagem indevida à denunciada".

As acusações contra a ex-governadora, porém, vão além. Segundo os promotres foi ela quem, além de aprovar a minuta do convênio julgado como viciado entre o Instituto IRTDPJ/RN e o Detran/RN, também encaminhou o Projeto de Lei que instituía a criação do Plano de Controle de Poluição Veicular à Assembleia Legislativa para a aprovação. Aprovada a lei, os empresários desencadearam o processo de licitação que culminou com a contratação fraudulenta do Consórcio Inspar. A assessoria de imprensa de Wilma de Faria afirmou que ainda não há programação sobre a publicação de uma nota oficial ou entrevista sobre o que defende a ex-governadora em relação ao tema.

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